TRAVESSIA CAPIBARIBE
localização
Recife - Brasil
projeto
2022
arquitetura
messina | rivas architectura
Breno Felisbino
Imagem
Thiago Augustus
Terceira margem do Rio Capibaribe
Concurso Nacional Travessias Capibaribe
Introdução
Uma das particularidades de um Rio é a sua habilidade de criar relações. Sejam elas de proximidade ou afastamento, um Rio gera diferenças fundamentais de margem, de fauna e flora, de povos e paisagem, e entre outros. Já a condição de uma travessia é justamente estar no meio dessas diferenças, isto é, em um” espaço entre” inconstante e, por isso, de muita potência e disputa.
De tempos pra cá, a lógica predominante nas cidades não soube se afetar por esses potenciais, “virando as costas” para a presença fluvial e fazendo das travessias apenas uma transposição funcional, predominantemente automobilística. No entanto, há aqueles ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores e muitos outros que resistem em conviver com os corpos d’agua multiplicando a vida ao redor de si.
Lembrando, portanto, daqueles potenciais criadores e alertando para os efeitos socioambientais que ameaçam as condições de habitabilidade nas cidades. Podemos estabelecer outras relações e reaprender a ouvir os rios criando afetos com a sua presença?
Contexo
O Concurso Nacional Travessias Capibaribe é oportuno nesse sentido, pois nos provoca a priorizar tanto a potência relacional de um rio quanto a potência mediadora das passarelas.
Traz ainda a inevitável consideração da condição histórico-territorial estratégica que os 240km do Rio Capibaribe e as suas diversas “ruas sobre as águas” exerceram e ainda exercem na formação da cidade de Recife. Condição essa reforçada pelo Plano Recife 500 Anos e o Projeto do Parque Capibaribe que procuram resgatar a vocação fluvial de uma cidade-parque através de infraestruturas urbanas sustentáveis que fazem as margens se voltar novamente para as águas. Como resgatar essa condição?
Conceito
É com esse Norte que nos aproximamos da proposta de anteprojeto para as duas passarelas no rio Capibaribe e as suas cabeceiras. Um projeto que procura fazer as diferenças confluírem, sejam elas entre as margens, entre a rua e o rio, entre arquitetura e estrutura, entre o social e o ambiental, em suma, entre as naturezas e as culturas.
Para as cabeceiras é importante que a “chegada” seja em continuidade com o passeio público. Para isso, de modo a integrar a malha urbana alargamos as calçadas de forma a consolidar praças-mirante de “chegada” que recebem a população em seus mais diversos fluxos. A partir dessas praças definimos um claro eixo de orientação que funciona como um “percurso” e garante os sete princípios de desenho universal.
Já nas passarelas o gesto que permeia as suas ações projetuais será o de construir o horizonte fluvial da cidade e, através disso, “atravessar” e “honrar as águas” do Rio Capibaribe e sua fauna e flora adjacente. Com isso, não se trata de apenas revelar uma paisagem distante, mas antes de se entender enquanto paisagem e, a partir disso, projetar.
Sistema Estrutural
A premissa dos projetos das passarelas é de que elas sejam, em primeiro lugar, equipamentos públicos oportunos tanto para as pessoas, os animais e as plantas quanto para as águas e as edificações que envolvem a sua implantação. Para isso, será necessária uma confluência entre arquitetura e estrutura de modo a encontrar uma razão técnica eficiente, sustentável, econômica, segura, de baixa manutenção e de pouco impacto ambiental, mas também com uma consistência conceitual significativa, uma identidade marcante e um alto valor de uso público. Eis o desafio.
Com isso, visamos um critério de simplicidade estrutural que oriente ambas as passarelas, pois é satisfatório que os projetos garantam integridade, de modo a assegurar controle de custo além de incentivar aquilo que se denomina uma memória coletiva e afetiva das passarelas.
O critério estrutural se apresenta através de duas vigas biapoiadas e articuladas, sendo que cada uma é constituída por dois pilares de concreto armado rio-orientados e uma treliça metálica que vence a calha de navegação e pendura com tirantes o tabuleiro da passarela que flutua sobre o rio permitindo um atravessamento continuando o nivel da rua. Esse sistema estrutural hibrido é tradicional na construção civil e faz referência há um extenso histórico recifense de passarelas em treliça – vide a ponte da Boa Vista, a ponte do Caxangá e a ponte Giratória.
Os efeitos desse sistema são oportunos pois através de um gesto claro atingimos grandes virtudes. Entre elas, a liberação do horizonte através de uma janela panorâmica reforçada por um banco central que faz da passarela uma grande varanda de contemplação. Além disso, as duas vigas articuladas são amparo de infraestruturas podendo suportar filtros de sombra, placas solares, luminárias ou mesmo estruturas temporárias. Já o tabuleiro é visto como um chão livre permitindo os mais imprevistos usos de participação local, mas também com uma mobilidade ativa de acessibilidade universal.
Conclusão
Como se a rua fosse um rio, que se adapta as mais diversas situações e flutua sobre a terra, a passarela e o rio confluem, criando uma terceira margem que dilui as fronteiras e é como uma promessa de vida.